Leila Jinkings - impressões imagéticas



terça-feira, 6 de abril de 2010

Tirando do baú, repercussão importante

Lentes do norte*
Livro reúne trabalhos de 33 fotógrafos nascidos ou radicados no Pará, dando um panorama da produção artística na região
Por Luiz Chagas

Com a anistia e o princípio do fim do regime militar brasileiro, a fotografia, assim como outras manifestações artísticas, explodiu em criatividade e produção em vários pontos do País. Embora distante dos grandes centros, o Pará parece ter sido beneficiado com esta euforia. Pois foi justamente no final dos anos 70 que surgiu em Belém um grupo de realizadores que, com organização incomum, construiu um caudaloso conjunto de imagens, conforme atesta o fotógrafo e pesquisador paulista Rubens Fernandes Junior, autor do ensaio Militância política e dissonância poética, incluído no livro Fotografia contemporânea paraense – panorama 80/90 (Secretaria de Estado da Cultura/PA, 300 págs., R$ 100), que sai acompanhado de um CD-ROM. 

Trata-se de uma avaliação histórica e crítica da trajetória recente de 33 fotógrafos surgidos nas duas últimas décadas mais um tributo ao pioneiro Gratuliano Bibas (1917-1997). Composto de ensaios, textos explicativos em português e inglês, cronologia local e nacional, biografias dos focalizados e 136 fotos – quatro por artista, número elevado para 15 no CD-ROM, que também traz entrevistas em vídeo com a maioria deles –, o volume foi um projeto desenvolvido pela Associação Amigos dos Museus do Pará, sob a curadoria da arquiteta paulistana Rosely Nakagawa e coordenação do paraense Mariano Klautau Filho.

O interesse pela arte fotográfica praticada naquela região pode também ser medido pelas palavras do curador e crítico Paulo Herkenhoff, para quem o Pará está entre os quatro melhores produtores de fotografia no Brasil, ao lado de Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. Fundamento histórico-geográfico, pelo menos existe.


A mistura cultural de Leila



Belém e seu porto estavam estrategicamente localizados para os navios vindos da Europa e dos Estados Unidos. Ou seja, a maior parte das novidades passava primeiro por lá. Tanto é que, em 1844, apenas cinco anos após o daguerreótipo ter sido apresentado ao mundo na Academia Francesa de Ciências e Belas Artes, em Paris, a capital paraense já contava com um estabelecimento comercial dirigido pelo americano Charles DeForest Fredricks, que tirava “retratos coloridos em superior grau de perfeição”. Seguindo-se à febre dos cartões-postais, que dominou o mundo no primeiro quarto do século XX, Belém foi palco de movimentos fotoclubistas que persistiram bravamente até os anos 70. A explosão nos anos 80, ou o renascimento, como preferem os profissionais locais, aconteceu após um período no qual o cooperativismo floresceu no País, dando origem às agências e arquivos fotográficos nos grandes centros.

Cena local – Dominados por este espírito, profissionais paraenses ou lá radicados começaram a atuar na cena local dando cor e personalidade ao trabalho produzido na região. Nos anos 80 e 90, surgiram centros formadores e iniciativas como a FotoVaral, que se valia de expedientes característicos do mamulengo paraense e da literatura de cordel nordestina para promover eventos ligados à fotografia. Assim, a curadora Rosely achou ideal apresentar os profissionais em camadas visuais. A documental traz registros da arquitetura, do folclore e do povo, categoria à qual pertence a paraense Leila Jinkings, que no livro colore seu trabalho revestindo-o de conotações socioculturais diversas. Uma outra camada é a articuladora, que lida com cores, geometria e grafismos. Destacam-se o também paraense Luiz Braga, cujas fotos revelam o despojamento de situações cotidianas, e o baiano Janduari Simões, dono de um olhar aguçado para detalhes, mesmo que eles estejam quase perdidos numa imensidão de informações. A camada mais verticalizada, espectral, é representada pelo paulista Miguel Chikaoka e pelo paraense Orlando Maneschy, entre outros.

A chamada “fotografia expandida”, do igualmente paraense Gratuliano Bibas, forma a ponte entre o passado e o presente, enquanto o futuro é desenhado por nomes da chamada geração 90, como Alberto Bittar, Newton Ricardo Oliveira, Bárbara Freire e Paulo Almeida. Todos dando uma visão do Pará que tem mais a ver com a inacreditável rodovia Transamazônica, a guerrilha do Araguaia, o projeto Jari, o garimpo de Serra Pelada, o massacre de Carajás, os caciques Juruna, com o gravador a tiracolo, e Raoni, de braços dados com Sting, do que simplesmente pato no tucupi, carimbó ou castanha de caju.

*Matéria publicada na Revista Isto É, seção ARTES & ESPETÁCULOS, em 19/02/2003

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